10 ago 2007

*Confissões "



Nesta cidade do Rio de Janeiro
De milhões de habitantes
Estou sozinho no quarto
Estou sozinho na América.

Estarei mesmo sozinho?
Quantos mais não estarão também sozinhos?
Escutando estas musicas em seus quartos
Esperando cartas
À penumbra
As paredes olhando.
Ou outros mais
Sem teto
Com fome
Ao relento
Sem sonhos
Evadindo-se
Mas a qual direção há fuga?

E ainda há pouco aqui um ruído
Anunciou vida a meu lado.
Certo não é vida humana,
Mas é vida. E sinto a Bruxa
Presa na zona de luz.

De milhões de habitantes!
E nem precisava muito
Vejo rostos ,reconheço nomes,
Com tantos falo ,a tantos ouço
Mas cadê
Cadê se não apenas este vazio.

Precisava de companhia
Dessas que suportassem me calado, quase distante,
Destas que lêem verso de Horácio
Mas secretamente influem
Na vida, no amor, na carne.
Estou só, não tenho amigo,
E a essa hora tardia
Como procurar amigo?

Mas
Talvez queira mais e tanto.
Precisava de mulher
Que entrasse nesse minuto,
Dançasse esta musica
Sentisse a canção que invento
Recebesse esse carinho
Salvasse do aniquilamento
Um minuto e um carinho loucos
Que tenho para oferecer.

Em milhões de habitantes
Quantas mulheres prováveis
Interrogam-se no espelho
Medindo o tempo perdido
Até que venha a manhã
Trazer leite, jornal, calma.
Porém a essa hora vazia
Como descobrir mulher?

Esta cidade do Rio!
Mas...
Outros mais têm mais palavras meigas,
Conhecem vozes de mais bichos,
Sabem os beijos mais violentos,
Eu apenas viajei e nem tanto,
briguei, aprendi e pairo reflexivo
Diletante
fora de meu tempo
Absorto em pensamentos

Estou cercado de olhos,
de mãos, afetos, procuras
e silêncio
Mas se tento comunicar-me,
O que há é apenas a noite
E uma espantosa solidão
E mergulho ,
Imerso numa multidão de indivíduos.

Ah! Companheiros
Notívagos ,insones ,ocultos
Escutai-me!
Essa presença agitada
Querendo romper a noite
Não é simplesmente a Bruxa.
É antes só a confidência
Exalando-se de mais um individuo.

(-adaptado de A bruxa
de Carlos Drummond de Andrade)

"Aforismos"



I-
“Nada além de uma palavra.Nada além de uma prece.Nada além de um movimento de alma.Nada além de uma prova de que ainda se vive e se espera.

Não,prece,não.Nada além deu um sopro.Nem sopro,nada além de uma disposição.Nem disposição,nada além de um pensamento.Nem pensamento .Nada além de um tranqüilo sono!

Noite de insônia .Já a terceira de uma série .Durmo sem esforço,mas,ao cabo de uma hora,desperto com a impressão de ter enfiado a cabeça num buraco medonho.Vejo –me completamente acordado,como se não tivesse nada dormido:o trabalho de adormecer irá começar ,visto que o sono se me recusa...

E ouso então ouvir as asas de um Anjo.E anunciada a madorna, vem o alento, ainda que não como o desejado, ainda tem se um pouco de tempo, e sob o toque tão terno adormece-se ainda conseguindo o respiro

Desse momento em diante,pelo resto do fim da noite até aí por volta das cinco horas ,toda vez que pego no sono ,agitados pesadelos me trazem de volta á vigília.A bem dizer,durmo ao lado de mim,em luta com os próprios sonhos.”

II-
. "(...)A distância por vezes é boa.
Pois na outra margem há a alegria que mais o sublima.
e ao deparar-se com o abismo,mais este se impõe e se infinita.
(...)
E vê-se como que frente a um espelho,para que assim o individuo encontre a certeza,a única, de não poder incitar-se a alçar vôo e transpor o abismo.Mas,sim,devesse então dar um só grande salto no escuro e,deveras,nas trevas cair e assim se cessar e por-se em súbito silêncio.(...)"

III-
"Um primeiro sinal do conhecimento nascente é o desejo de morrer. Esta vida parece insuportável; uma outra, inalcançável. Então não há mais vergonha em se desejar morrer; pede-se apenas o deslocamento da velha cela, que se odeia, para uma nova, a qual no devido tempo se aprenderá a odiar. Um resquício de fé deverá fazer crer, durante a mudança, que o S-nhor vai casualmente surgir no corredor, olhar o prisioneiro e dizer: “Este não deve ser preso novamente. Ele vem comigo”.

IV-
O homem se imagina um cidadão livre e protegido deste mundo pois a ele está preso por uma corrente longa ao ponto de lhe permitir completa liberdade de movimento por todo espaço terreno ,mas não tão longa que lhe permita ultrapassar seus limites. Ao mesmo tempo ,no entanto, pode sentir-se também um cidadão livre e protegido do mundo celestial,ao qual se vê ligado por uma corrente semelhante.Assim sendo ,ele se vê contido pela corrente que o prende ao céu toda vez que pretenda dirigir-se à Terra,ocorrendo o inverso quando deseje alcançar o firmamento.Ocorre ,porém,que todas as possibilidades estão diante dele, e bem sabe disso,pois se recusa a aceitar o impasse decorrente da contenção original."

Antigamente,não podia entender por que minhas perguntas ficavam sem respostas;hoje,não posso entender como é que pensei ter a capacidade de perguntar.Na verdade, eu realmente não pensava:eu apenas perguntava.”

V-(...) Seria algo realmente desesperador, se caminhasses numa planície, com a agradável sensação de estar a avançar, quando na verdade retrocedias. Como porém escalavas uma encosta abrupta, bastante inclinada,conforme por ti mesmo vista de baixo, a causa do retrocesso bem poderia ser devido à disposição do terreno.Mas não,não deves desesperar. Por que a partir de um certo ponto não há mais retorno. Sim,a partir de um dado ponto, o unico objetivo é o proprio limite .E é esse o ponto que deve ser alcançado. Se sobrarem sonhos e faltarem forças e não mais puderes surpreender nem a si mesmo,então ,ao limite, a este traço , ponto ultimo e final terás atingido. Com o coração na mão até o limite ultimo pois a Vida é uma atitude solitária:Do Nasce-se,Vive-se e Morre-se,Só.Uma extensa estrada,solitaria, por vezes longa demais.

VI-O que deveria fazer?Ser.Apenas e assim pensar existir anonimamente ao tornar ao grão de poeira que fostes e que ajuntado pelas mãos fez-se um homem .Devesse agora então tornar ao pó,escoando, lançado ao vento ,ao esquecimento
.ציונות סוציאליסטית

VII-
"O caminho verdadeiro segue por sobre uma corda, que não está esticada no alto,mas se estende quase rente ao chão. Parece mais determinado a fazer tropeçar, do que a caminhar por ela" Na verdade uma corda bamba, ora tendendo a levar a um lado e outro, a fazer quase cair e poucos não cambaleam e uma vez isto ,perdendo o equilibrio ,desistem de caminhar por ela, apenas seguindo assistindo.Esta é a vida.E poucos conseguem libertar-se da mesmicie disto,tal como a quem me referi quando esbocei isto.Pena ser impossivel copia-la por que é indiscutivelmente ímpar.

VIII-

Trabalhas sem alegria para um mundo caduco,onde as formas e as ações não enceram nenhum exemplo.Praticas laboriosamente os gestos universais,sentes calor e frio, falta de dinheiro,fome e desejo sexual.Heróis enchem os parques da cidade em que te arrastas,e preconizam a virtude, a renúncia, o sangue-frio, a concepção.À noite, se neblina, abrem guardas chuvas de bronze ou se recolhem aos volumes de sinistras bibliotecas.

Amas a noite pelo poder de aniquilamento que encerrae sabes que,dormindo, os problemas te dispensam de morrer.Mas o terrível despertar prova a existência da Grande Máquina e te repõe, pequenino, em face de indecifráveis palmeiras.Caminhas por entre os mortos e com eles conversas sobre coisas do tempo futuro e negócios do espírito(...)

Coração orgulhoso,tens pressa de confessar tua derrotae adiar para outro século a felicidade coletiva.Aceitas a chuva, a guerra, o desemprego e a injusta distribuição porque não podes (mais), sozinho(viver a vida)dinamitar a ilha de Manhattan.

Ou deitar suspirando a morte ou Revolução que não acontecem nunca.